Desde os tempos imemoriais, a humanidade tem desenvolvido rituais para honrar a passagem dos entes queridos, sendo o funeral um dos mais marcantes e simbólicos. É um momento de tristeza, dor e despedida, em que nos reunimos para prestar nossas últimas homenagens àqueles que partiram. No entanto, ao longo dos anos, tenho percebido um paradoxo intrigante envolvendo esse evento aparentemente sombrio.
Como tradicionais preenchedores de atestados de óbito, na profissão somos, enquanto médicos, frequentemente deparados com um duro e frio papel a ser preenchidos com rabiscos à esferográfica azul. Sim. Sem tecnologia. É na arte da caligrafia que ele se confecciona. É desde aquele instante que a reverberação reflexiva se inicia.
É curioso como, mesmo cercados por lutos e melancolia, os funerais conseguem proporcionar uma oportunidade única para reflexão e celebração da vida. Enquanto carregamos a tristeza pela perda, somos igualmente lembrados da importância de valorizar cada momento e de expressar amor e gratidão aos que ainda estão presentes em nossa vida.
Ao comparecer a um funeral, somos confrontados com a efemeridade da existência humana. O contraste entre a solenidade do momento e a inevitabilidade da morte nos faz refletir sobre a finitude de nossa própria jornada. É um lembrete doloroso, porém necessário, de que cada respiração é preciosa e que devemos aproveitar ao máximo nosso tempo neste mundo fugaz.
A ironia do funeral é que, em meio à tristeza, encontramos uma oportunidade para nos conectarmos mais profundamente com nossas emoções e com as pessoas ao nosso redor. A perda nos impulsiona a abraçar o afeto, expressar palavras de conforto e oferecer apoio incondicional aos enlutados. Nesses momentos difíceis, nos deparamos com uma força coletiva capaz de superar a dor e criar laços ainda mais fortes entre os presentes.
Enquanto observamos o caixão descer à terra, somos confrontados com a nossa própria mortalidade. A certeza da finitude da vida nos impulsiona a repensar nossas prioridades, a valorizar as relações e a buscar um sentido mais pleno para nossa existência. É como se, paradoxalmente, a morte nos despertasse para a vida.
No entanto, é importante lembrar que, mesmo diante de tal paradoxo, o luto é um processo complexo e individual. Cada pessoa enfrenta a perda de maneira única e tem seu próprio tempo para lidar com as emoções e encontrar a paz interior. É essencial respeitar o espaço e o tempo de cada um, oferecendo apoio e compreensão nesse momento de fragilidade.
Funeral é um ar frio cálido, com suores nas frontes. É um seco momento, banhado em lágrimas. É um silêncio gritante. É uma dor, inerte.
Funeral é uma mensagem.
Funeral serve mesmo aos que ficam. Sem fim.
Funeral é um bilhete. De recomeço, para ser mais exato.
É um lembrete poderoso de que, mesmo diante da efemeridade da existência, podemos encontrar significado e conexão nos momentos mais desafiadores.
É tempo de sermos mais tudo o que pudermos ser.
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